o gato leitor é uma coluna do gato escritor em que comento sobre as minhas leituras, trazendo a minha opinião sobre o livro e destacando alguns pontos da obra.
Faz algum tempo que não apareço por aqui e faz ainda mais tempo que não atualizo o Gato Leitor com as minhas leituras. O último foi em fevereiro, com uma leitura que eu terminei em novembro (gritos de desespero), ou seja, temos leitura de pelo menos uns sete meses acumuladas. Comentar uma a uma vai demorar mil anos, e tenho que admitir que a essa altura do campeonato, que já não lembro de todos os detalhes de alguns livros.
Por isso decidi juntar tudo em um único texto. Não me aprofundo tanto quanto estamos acostumados na coluna, mas pelo menos comentei um pouco sobre cada leitura, sem deixar ninguém de fora. Vamos lá:
A rainha de dois reinos (por Madu Gonçalves)
Amantes de romantasia: eu os invoco! A rainha de dois reinos segue uma narrativa de profundo conflito entre dois reinos, em que a única provável saída, para resolver um problema que se desenrola por anos, é o casamento arranjado entre o atual regente de um lado e a herdeira do outro.
Acho que uma das marcas que mais gosto nas narrativas da Madu é a forma profunda com que ela trata as emoções das personagens. Nesse livro, Beatrice coloca o dever acima dos seus próprios desejos, ainda que carregue dúvidas sobre a sua capacidade como líder, ela não hesita quando é preciso desempenhar o seu papel como futura regente, porque acima dela está o bem estar do seu povo. Hector quer ser capaz de fazer aquilo que o pai não conseguiu: acabar com a guerra. Num movimento ousado, parte dele a ideia de se casar com aquela que, aos olhos de muitos, é a inimiga; ele precisa ser corajoso e defender aquilo que acredita.
É uma história rápida, em que mergulhamos num jogo político que é o motivo de Beatrice e Hector se unirem em matrimônio. Tenho certeza de que você terminará a leitura desejando que a Madu nos conte um pouco mais sobre eles.
Cafés e lendas (por Travis Baldree)
O primeiro livro que acabei em 2025, comecei a leitura durante a minha viagem para Belo Horizonte, e se tornou um favorito. Foi a primeira cozy fantasy que eu li e o que foi prometido se concretizou: terminei a leitura me sentindo dentro de um abraço quentinho.
Viv, a protagonista, é uma orc que passou anos ganhando a vida como uma caçadora de recompensas. Junto de outras criaturas fantásticas, formavam um grupo que se metia em situações adversas para recuperar itens de valor. No entanto, Viv quer mais da sua vida do que apenas pular de uma missão para a próxima: ela quer abrir um café.
No melhor estilo das histórias de formação de famílias improváveis (found family), Viv se fixa em uma pequena cidade e passa a contar com criaturas que surgem durante o seu processo de montar um café. O curioso é que ninguém conhece a bebida, nesse universo uma iguaria gnômica.
É uma história leve, apesar do contexto um tanto violento no qual Viv viveu por muito tempo. O foco da narrativa é realmente a construção do café, os percalços nessa trajetória e a aproximação de criaturas que, se não fosse por esse café, talvez nunca se conheceriam.
Amor fati (por G. B. Baldassari)
O amor estava mesmo no ar nesse começo de ano, que Amor fati segue a nossa linha açucarada. O livro foi primeiro lançado de forma independente, mas atualmente é possível comprar a versão física pela editora Euphoria e o e-book está disponível na plataforma do Kindle.
Uma história em que opostos se atraem. Abby está quebrada: tem um emprego que não paga grande coisa, mora num apartamento bagunçado e suas perspectivas não enxergam muito além desse contexto. Até que um dia uma garotinha, Lily, bate na sua porta e anuncia o que Abby não esperava ver algum dia: ela é a sua filha, que foi entregue para adoção logo na maternidade.
Lily foi adotada por Eva, uma advogada bem-sucedida que criou a garota sozinha. O encontro que nunca deveria acontecer, leva Abby a se tornar a professora de caratê de Lily e, dessa forma, a frequentar esse ambiente familiar.
A história é divertida, com algumas pitadas de drama, e, claro, um romance que vai se construindo lentamente.
Impostora (por R. F. Kuang)
Que eu sou louca por qualquer coisa que a R. F. Kuang escreve já não é mais novidade. Finalmente li Impostora com as minha amigas, e tenho que admitir que, de todos os livros que li da Kuang até agora, é o que menos gostei.
Diferente da trilogia A Guerra da Papoula e de Babel, esse é um romance contemporâneo sem qualquer pitada de fantasia. A verdade é que sinto que esse livro foi um grande desabafo da Kuang sobre o hospício que é o mercado editorial. A história acompanha Juniper, uma escritora que não consegue alavancar os seus livros, enquanto sua “amiga” da época da universidade, Athena, já é uma autora best-seller com livros sendo vendidos ao redor do mundo. O “amiga” entre aspas não é sem querer: Juniper não se considera assim tão próxima de Athena, na verdade, não a suporta, mas mantém um contato relativamente próximo.
Certo dia, elas estão no belo apartamento de Athena, as duas bêbadas, e essa é uma das primeiras vezes que Juniper está, de verdade, curtindo a companhia da outra. Ela descobre o rascunho de um manuscrito que Athena terminou recentemente, o que pode vir a ser o próximo grande livro dela. E nessa noite, Athena morre diante dos olhos de Juniper ao engasgar com a comida que dividiram; e o tal manuscrito, “sem querer” (nas palavras de Juniper), volta com ela para casa.
O livro discute autoria e plágio (Juniper lança o manuscrito de Athena e se torna uma autora best-seller); discute a forma como o mercado editorial funciona (uma savana cheia de leões famintos, um antro de hipocrisia). Juniper é uma mulher branca, Athena uma mulher chinesa; é fácil ver a Kuang escrevendo esse livro com uma caneta em chamas, porque não seria exagero imaginar que algumas coisas que ela coloca no papel, talvez tenha ouvido.
O livro é ruim? Não. Eu amei ele? Também não. Acredito que ele traz uma discussão muito interessante sobre autoria e cópia, ainda mais porque esse é o tema da minha pesquisa de mestrado, em alguns momentos eu pirava com o que lia. No geral, não é uma leitura de todo ruim, mas para mim deixou um pouco a desejar, em especial o final, a forma como ele se desenrola. Eu me senti um pouco como o Paulo Ratz.
Jenipapo western (por Tito Leite)
Se ninguém tem dúvida de que amo os livros da Kuang, ninguém também tem dúvida de que eu amo um bom faroeste. Aninha quer muito que um dia eu escreva um faroeste em terras brasileiras, então me presenteou com Jenipapo western como um incentivo. É um livro muito rápido, que ousaria dizer que até rápido demais, mas que me encontrei completamente imersa na narrativa.
Somos transportados para Jenipapo, no sertão. Um dos principais meios de movimentação econômica na região é a produção de algodão, mas que gera uma verdadeira máfia: todo o poder de comercialização está concentrado na mão de uma única pessoa, que usa a cooperativa para explorar os pequenos produtores rurais, pagando valores ridículos e lucrando em cima do trabalho árduo dos outros. Até que Ivanildo se cansa dessa exploração, ele se recusa a vender seu algodão para a cooperativa, e decide que levará a produção da sua família para vender na cidade vizinha. E isso desencadeia uma verdadeira desgraça para eles.
Naquela terra, ninguém desafia a soberania de Roberto e seus capangas. A família de Ivanildo, primeiro, é afastada da comunidade: ninguém mais conversa com eles, não compram mais os seus produtos, não vendem mais nada a eles. Mas eles não desistem, levam a frente o plano de vender em outra cidade, e a retaliação dessa vez é mais pesada: o seu irmão gêmeo de Ivanildo, o gentil Sandro, é morto a sangue frio.
A partir desse ponto, começa um ciclo de violência e retaliação. Ambos os lados se atacando, Ivanildo e família precisam apelar para a mesma violência que queriam tanto evitar. É uma verdadeira tragédia no faroeste brasileiro em que a única forma de combater a violência é com mais violência.
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